sábado, 31 de outubro de 2009

Ora, bolas.

Chego e sento-me. De ínicio tento alguma aproximação: "- Como vai? Passou bem a semana?" A resposta é seca: " - Sim, foi tudo bem." Após um pequeno intervalo, a recíproca: " - E você, como vai?" Me animo. De certa forma, ela se mostrara aberta à um bate-papo, conversas e, quem sabe, confidências. Me preparo para ser o centro, como sempre gostei. Me satisfaço com o interesse em mim, o cruzar suave das mãos em minha intenção e o olhar penetrante, daquele que perfura a pele e alcança o canto mais esquecido da alma. Olho no olho, palavra por palavra. Por vezes tento reverter o quadro e percustrar o castanho lívido dos seus olhos. Procuro saber o que ela esconde por detrás dos cachos de amêndoas, o que pensa quando fora e dentro daquela sala. Cruzo as mãos e assumo uma postura freudiana. Rebato as perguntas, tento vencer suas questões com argumentos sensatos. A empresa é em vão. Aquela postura impávida, forte e segura é inabálavel. Repele qualquer tentativa de intimidade e derruba por terra, com uma sapiência admirável, minhas argumentações infudadas. Apaziguo minha atitude com a teoria dos vícios familiares. A curiosidade e o forte senso autoritário herdado dos Sampaio junto com o empreendedorismo orgulhoso dos Dantas me deixaram assim: questionador, altivo e soberbo. Nem ela precisaria me dizer isso. Eu mesmo percebo e desarmo todas tentativas de auto-afirmação. Assumo um estado neutro, e encaro a relação como ela é: profissional. O analisado sou eu e ela a analisante. Ela deve saber o que está fazendo, ora bolas. E sabe mesmo. Sacode minha cabeça, revira os pensamentos e descobre mágoas tão magoadas que tinham descansado num estado de latência, num canto qualquer da mente. Nos encontramos duas vezes na semana. Nesse meio tempo, ela vive em mim. Sua voz permeia as idéias, como que uma nova consciência. A única frustração é não conseguir transpôr a parede que ela mesma criara contra pessoas como eu, com os vícios dos Sampaio Dantas. Pesa-me a idéia dessa mulher ter minha vida consigo e eu nada saber sobre a dita-cuja, a não ser que enxerga por pulipas cor de mel e tem os fios de cabelo extraídos da mais fina das amendôeiras.

2 comentários:

João disse...

Ótimo texto, peão!

Quem já passou por tal situação consegue se identificar bastante com o que você escreveu, muito bem escrito por sinal.

Abraço do seu fã!

JG

Hugo disse...

To quase assim heheh

Abraços man